sábado, 18 de junho de 2022

Esse não é um post marqueteiro

 

Dentre aquelas coisas todas do sou mil possíveis em mim, não posso escolher apenas um deles – or whatever like this – eu sou fotógrafa. Acho sempre muito difícil conjugar o verbo na forma “eu sou”. Para algumas coisas mais que outras. Eu sou fotógrafa é algo que sempre me faz pensar: AM I? E daí nesse último dia dos namorados, um domingo de sol de outono, fui fazer umas fotos no Jardim Botânico de um casal de gêmeos – a Gaia e o Benjamin, filhos da minha colega de faculdade, a Thaís. Eu e a Thaís partilhamos um momento dramático na vida de qualquer serhumano-universitário-de-licenciatura: fizemos o estágio curricular supervisionado de Ensino Fundamental na mesma escola.  O tipo de coisa que a gente não sabe como sobreviveu no final. Lembro da Thaís corajosamente propondo produzir cerâmica queimada no fogão da própria escola com uma turma de 6º Ano. A pessoa com tamanha audácia sabe ao que veio nesse mundo de meodeos, respect. A gente não era assim, amigas. Eu não fiquei amiga de quase ninguém durante a graduação, pois a Amanda-pós-adolescente levava muito a sério aquela máxima de Sartre “O inferno são os outros”. Depois daquele 6º Ano do Leopolda Barnewitz, a Thaís deixou da educação e foi pra área da saúde. Ano passado nossos caminhos se cruzaram novamente quando ela me mandou uma mensagem perguntando sobre ensaio fotográfico, pois tinha gêmeos prestes a completar um ano. São quase sempre bonitos esses momentos onde as paralelas novamente se cruzam. And then. Estava eu aqui editando algumas fotos do ensaio e me vi comovida com o resultado. Tem uns problemas técnicos, sabe qual é? Junho nos pagos do Rio Grande faz frio, marcamos de nos encontrar num horário um pouco mais tarde por conta disso. Tem muito sol em algumas fotos, não era aquele solzinho matinal, não era golden hour. Pero que. Esse tipo de coisa às vezes não importa. Esse sentimento começou numa foto onde a Thaís está andando a frente e a Gaia a segue. E isso foi algo que me chamou atenção durante aquela manhã: a Thaís deixou as crianças muito livres pra curtir o ambiente, explorar, mas cada vez que ela se deslocava, os dois aos poucos iam seguindo atrás dela aos sons de “mamamamama”. Aquela figura meio natureza clássica – pois que somos naturais, nós, os humanos – dos pintinhos seguindo a galinha. Essa cena se repetiu muitas vezes, sem aviso, sem alarde. Naquela serenidade dos acordos não ditos. Segui nas edições me maravilhando com a beleza do maternar e paternar nos gestos cotidianos. Tem muitas fotos do pai da Gaia e do Benjamin naquela posição meio centroavante. Uma mão atenta pra aparar uma queda, ou pra oferecer um suporte. Sim, eu me emociono com relações respeitosas, solidárias e amáveis de parentalidade. Parece pouco, mas a real é que é muito. É tudo. Uma manhã é nada pra que eu esteja aqui nessa verborragia sobre as relações cotidianas das pessoas, eu sei. Mas é que tem coisas que saltam aos olhos – especialmente quando a gente vive nesse upside down que virou a terra brasilis. Eu sempre lamento que pessoas potentes e admiráveis optem por não ter filhos. E eu sempre fico feliz por encontrar pessoas potentes e admiráveis que opte por tê-los. Depois teve um momento. Um momento num domingo de sol no quase-inverno de Porto Alegre quando a Thaís ofereceu chá de gengibre pra aquecer a Gaia e o Benjamin. E eles vieram – sempre naquela movimentação quase mística, numa naturalidade óbvia das coisas simples – beberam o chá – no copinho, com um ano e meio! – e seguiram nas suas explorações. Gaia espevitada, Benjamin reflexivo. Pequenos desafiadores de estereótipos de gênero. Respeitados e amparados no seu devir, no descobrir e desvelar. That's what rock 'n' roll is all about. Eu sempre acho meio difícil dizer: eu sou fotógrafa. Talvez seja porque não é tudo ou todo mundo que vale a pena fotografar. Eu tenho essa dificuldade de encarnar a e-m-p-r-e-e-n-d-e-d-o-r-a. A vendedora de momentos imortalizados num click. Mas a real, folks. A real é que fotografia de gente escrota nunca fica bonita. Nunca fica bonita porque tem algo que a fotografia captura que transcende. Não dá pra pôr na imagem o que não é e o que não está. E aqui o verbo é essa coisa to be aglutinada mesmo. Fotografia só faz sentido se tiver amor. Esse é um post por mais dias de frio com sol e por mais pais que ofereçam chá de gengibre aos filhos nesses dias – chá de gengibre, acolhimento, segurança, encorajamento e aquele olhar de quem acredita que: dias melhores virão.