terça-feira, 19 de abril de 2011

Cabelos Cor de Ameixa-Roxa

Cabelos cor de Ameixa-Roxa. Unhas vermelhas. Já são possíveis os cachecóis & os lenços ao vento. Logo virão as boinas, as botas e as bitucas. O hot choc nas xícaras old style & os restos de vinho tinto no fundo das taças. O doce e o amargo se derramam com suavidade plástica sobre a amarelicidade outonal.


Pelos Solos Desertos da Insônia

A noite toca com bordas claras as persianas da janela. O sono não vem. O sonho tampouco. Eu pálida, esquálida, incompleta. Em certas luas, o universo inteiro me grita. Por dentro, pelos olhos, pela boca seca e pela pele. O infinito pertence ao tempo não contado das horas mortas. A imaginação condena o Homem. O Homem condena o Destino. Flamejam palavras turvas sob a folha do papel. Flamejam surtos silenciosos do outro lado do espelho. A incompreensão do olhar sem fim. A agonia das notas tensas - como se a nona sinfonia pulsasse nas têmporas sem parar. Um lugar ao qual nunca se chega. Um lugar que não existe porque não se está lá. Oásis. Santuário. What are you looking for? Impera, soberbo e arrogante sob o altar das estrelas, um sorriso mitológico de estátua grega. Resoluta, porém incapaz de intuir o que se esconde por trás do ser que emerge intocável. Hay que endurecerse. Hay que olvidarse. Hay que flotar sobre el agua. Sim, misterioso feito um rio que não se sabe de onde vem, nem para onde corre. Toco a ponta do meus dedos na ponta dos dedos frios do meu duplo no espelho, que mira sem modificar minha expressão. Sem explicar, sem entender. Apenas refletindo. Minhas nítidas cores, gestos, impactos, interrogações, anseios e olheiras crônicas. A inquietação vem do desalinho dos cabelos. É tempo de Ameixas-Roxas.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Ahí, pero dónde, cómo


"No depende de la voluntad"
(Julio Cortázar)

De repente, ontem, me deparei com essa frase, nas páginas de Cortázar. Era um conto, Ahí pero dónde, cómo. Um tanto perturbador. Denso, tenso, sôfrego. Daqueles que a gente tropeça nas letras enquanto lê, e entende sem se apegar exatamente ao sentido literal - mas sim as sensações que brotam como coisa viva. Quase possível ouvir o retinir das teclas de uma velha máquina de escrever, quase possível ouvir o semi-silêncio do cigarro queimando na penumbra, quase possível sentir a textura do vidro de uma janela entreaberta&embaçada numa numa noite fria de inverno. Uma estética que embora seja imaginada - pois que o conto em si não tem nada a ver com cigarros e invernos -, subitamente emergiu quase plástica. Deve ser a narração em primeira pessoa, que faz a gente se transportar para a dimensão que o autor ocupa. O conto é um fluxo de consciência, no qual o narrador fala de como "sente-a-certeza" de que um amigo que morreu a mais de 30 anos ainda está vivo. Ele está sempre vivo, e ele sempre está prestes a morrer outra vez, e ele sempre morre, e ele logo volta ao momento precedente a morte outra vez, e assim sucessivamente - no sonhos, na realidade. Anyway. Quando eu li a frase que abre o Conto: "Não depende da vontade.", eu senti aquele entendimento e identificação que sobrevêm imediato quando algo diz respeito a nós mesmo - quando algo dialóga conosco DE FATO - e não é apenas uma informação que passa e vai embora. Essa frase sintetiza o sentido de tantas coisas espalhadas&esparças que fazem parte da minha suposta concepção essencialista/estruturalista de mundo. E também se harmoniza muito bem com a idéia do Eterno Retorno (aliás, a estrutura/temática do conto remete a um eterno retorno, a ciclicidade dos eventos). Eu não falo aqui do corriqueiro e cotidiano, eu falo daquilo que subjaz. Falo no sentido metafísico da vida, da morte, da existência - e dos sentimentos todos que nos fazem humanos, também. Eu acredito que essas coisas todas que são as realmente importantes, elas não dependem da vontade. Elas simplesmente "São". Não sei como, por que, de onde - o que explica, o que não explica. Mas nada do que se sente pode ser manipulado do interior ou construído como verdade. As coisas brotam de si mesmas. Sejam elas Acasos, sejam elas Destinos.